Pandemia da obesidade acende alerta
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A obesidade é um dos fatores que aumentam os riscos de doenças cardiovasculares, problemas psicológicos e câncer. Especialistas apontam a necessidade de se tratar a doença e não julgar
Obesidade no dicionário significa “condição da pessoa obesa, de quem acumula uma quantidade excessiva de gordura no organismo, sendo caracterizada pelo aumento de peso”. Na medicina ela é considerada uma patologia (doença). Em todas as definições, a obesidade traz riscos e transtornos à vida de quem a possui.
Muito além da pandemia do coronavírus, o mundo vive uma pandemia de obesidade. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a obesidade é um dos problemas de saúde mais graves a serem enfrentados. A estimativa da Organização é que em 2025 2,3 bilhões de adultos ao redor do mundo estejam acima do peso, sendo 700 milhões de indivíduos com obesidade, isto é, com um índice de massa corporal (IMC) acima de 30.
Aqui no Brasil, a doença já atinge 96 milhões de pessoas. Entre 2003 e 2021, a proporção de indivíduos com obesidade saltou de 12% para 26% da população, segundo apontamento do Ministério da Saúde. Dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS 2019) revelam que a condição de obesidade já afeta cerca de 41,2 milhões de adultos, com distribuição maior em mulheres (29,5%) do que em homens (21,8%).
No Distrito Federal, dados da Secretaria de Saúde indicam que cerca de 70,28% dos adultos acompanhados pela Atenção Primária à Saúde estavam com excesso de peso em 2020, contra 59,84% em 2015. O excesso de peso foi registrado, no ano passado, em 55,04% dos idosos, 50,4% das gestantes, 34,98% dos adolescentes, 27,9% das crianças de 5 a 10 anos de idade e 7,87% das crianças abaixo dos 5 anos.
Mesmo sendo um fator de risco para a evolução de quadros mais graves da Covid-19 e alertas serem constantemente emitidos, a obesidade continua crescente. Cabe lembrar que a questão do aumento de peso colabora também para a elevação dos riscos de doenças cardiovasculares, distúrbios musculoesqueléticos, problemas psicológicos e câncer.
Estar acima do peso ideal não é uma questão meramente estética. Por vezes, a obesidade é resultado de condições médicas (uso de medicamentos, disfunções do organismo); condições psicológicas (traumas, depressão, ansiedade); condições ambientais (oferta de alimentos, condições financeiras). Para isso, a doença deve ser encarada com seriedade e sem preconceitos.
Rede de apoio
É preciso que a pessoa obesa procure ajuda. A psicóloga Simone Andrade (CRP-01/24582) alerta que “é necessário um olhar com menos preconceito, com menos julgamento e com muito mais acolhimento para a pessoa que sofre na pele as consequências da obesidade, sendo de suma importância um trabalho multidisciplinar para lidar com uma patologia que é multifatorial. Desta forma profissionais como psicólogos, médicos, nutricionistas, endocrinologistas, profissionais de educação física, entre outros devem trabalhar de forma conjunta para apoiar essa pessoa em todos os aspectos para que ela tenha sucesso no seu tratamento”, afirma.
Ela segue: “Não podemos deixar de considerar o sofrimento psicológico presente na vida da pessoa obesa. Ansiedade, raiva, tristeza, culpa, preocupação, sentimento de impotência, surgem como resultado de se sentir inadequado, discriminado e rejeitado por uma sociedade que prega um padrão de corpo ideal diferente da realidade do obeso, sendo assim, essa pessoa também apresenta um prejuízo da autoimagem e uma depreciação do autoconceito e da autoestima. Em consequência disso tudo, começa a existir o afastamento das relações sociais, isolamento, depressão, redução significativa na vontade de sair, de dançar, de viver e também de se relacionar sexualmente, já que não se sente desejável em função de estar acima do peso”, alerta.
A rede pública de saúde do Distrito Federal também oferece suporte. As portas de entrada são as Unidades Básicas de Saúde, onde os pacientes procuram ajuda por conta de alguma queixa e são encaminhados para tratar da obesidade. O acompanhamento é feito de maneira interdisciplinar com nutricionistas, psicólogos, endocrinologistas e cardiologistas.
Dependendo do caso, a pessoa poderá ser encaminhada para uma unidade especializada, como o Centro Especializado em Diabetes, Obesidade e Hipertensão (Cedoh), localizado na Asa Norte. Ali, uma equipe multidisciplinar pode acompanhar o desenvolvimento dos pacientes em diversos aspectos da vida. Além disso, eles são responsáveis por analisar cada caso especificamente e fazer a indicação, ou não, para cirurgias bariátricas.
A endocrinologista Alexandra Rubim, gerente do Cedoh explica que “não basta só fazer dieta e atividade física. Existe todo o contexto, como controlar o stress, uma boa quantidade de sono, ingestão de água. Por isso é muito importante ter uma equipe multiprofissional”.
Para a psicóloga Simone, “é necessário que tanto o paciente quanto familiares sejam educados sobre a doença e suas consequências a curto e longo prazo. Assim o paciente também vai aprender a lidar melhor com as questões do dia a dia e como ter um comportamento mais assertivo diante dos problemas e desafios, além de aprender formas de enfrentamento mais saudáveis. O terapeuta também auxilia o paciente no monitoramento dos seus comportamentos alimentares para que ele próprio possa estar ciente das suas evoluções na mudança de comportamento”, encerra.
Ultraprocessados
Levantamento feito em 2020 apontou que houve um aumento considerável no consumo de ultraprocessados pelos brasileiros. Esses alimentos são aqueles que passaram por maior processamento industrial. No geral, possuem alta adição de açúcares, gorduras, substâncias sintetizadas em laboratório e, principalmente, conservantes.
Pesquisa foi realizada com pessoas entre 18 e 55 anos de todas as classes econômicas e de todas as regiões do Brasil, e revela que salgadinhos de pacote ou biscoitos salgados foram os produtos campeões de consumo em comparação com o levantamento realizado em 2019, subindo de 30% para 35% a proporção de pessoas que os consomem. O segundo lugar no ranking ficou para margarina, maionese, ketchup ou outros molhos industrializados, que registrou alta no consumo: de 50% para 54% em 2020.
Pesquisas da área da saúde divulgadas no ano passado concluem que o consumo de ultraprocessados aumenta em 26% o risco de obesidade. Quanto ao sobre peso e o aumento da circunferência abdominal os dados apontam que o consumo desses alimentos pode elevar de 23% a 34% as chances de adquirir essas características. Além disso, pode aumentar em 79% as chances de desenvolver síndrome metabólica, 102% de dislipidemia, de 29% a 34% de doenças cardiovasculares e de 25% da mortalidade por todas as causas.