Projeto que altera imposto de renda é criticado no Senado
Foto: Leopoldo Silva – Agência Senado
Relator considera importante manter a correção da tabela de IRPF e discutir alterações de IRPJ em outra ocasião
O projeto do Executivo Federal que traz alterações nas regras de cobrança do imposto de renda tem causado grandes discussões no Senado. Proposta aprovada pela Câmara Federal no dia 2 de agosto deste ano prevê, entre as alterações, correção na faixa de isenção – de R$ 1.903,98 para R$ 2.500 mensais – e taxação de 15% sobre lucros e dividendos, entre outras medidas.
Na última quarta-feira (27), senadores e especialistas participaram de audiência pública promovida pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Os participantes criticaram o projeto em análise. Segundo eles as alterações podem gerar problemas como perda de arrecadação para cofres públicos, fuga de investimentos no país, aumento da pejotização e estímulo ao endividamento de empresas.
De acordo com relator da matéria na Casa, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), todos os setores ouvidos não se manifestam favoráveis ao projeto. Ângelo destaca que o único ponto que merece atenção e deve ser mantido é a alteração da faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Ou seja, o Senado deve apenas deliberar sobre essa modificação, deixando as propostas de alterações no Imposto de Renda pessoa Jurídica (IRPJ), bem como a tributação de lucros de dividendos e a tributação das aplicações financeiras para outro tempo.
“Essa tabela do Imposto de Renda precisa sofrer um reajuste que melhore o poder de compra da sociedade brasileira. Eu estou pensando e vou trazer isso para apreciação desta Comissão, fazermos um projeto autônomo só para a tabela do imposto de renda e deixar o projeto que cuida das “PJ” para ir amadurecendo depois”, disse o relator.
O texto aprovado pela Câmara reduz também as alíquotas, tanto para pessoas físicas (IRPF), quanto para empresas (IRPJ), taxa a distribuição de lucros e dividendos e estipula o fim do chamado Juro sobre Capital Próprio (JCP), que se caracteriza por ser uma forma muito comum de as empresas remunerarem seus sócios e pagar menos impostos.
Esse ponto foi bastante criticado pelo senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). Para ele, o texto que foi apresentado pelo Executivo já era ruim, mas com as mudanças sugeridas pela Câmara dos Deputados ficou “horroroso”.
“Elimina juro sobre capital próprio. Eu tenho a empresa x, eu ia colocar nessa empresa R$ 1 milhão, e a empresa ia poder deduzir juros do capital próprio e de alguma maneira pagar isso. Mas não vai poder mais. Então o que eu faço? Eu pego R$ 1 milhão, vou num banco qualquer e aplico. Vou receber juros desse banco. E a empresa empresta R$ 1 milhão do banco e paga os juros para o banco, simples, qualquer criança enxerga isso. No entanto, isso está escrito em um projeto assinado pelo Ministro da Economia”, criticou Guimarães
Redução na arrecadação
O ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, foi um dos participantes da sessão e pontuou que a reforma nesse momento se mostra inoportuna por conta das dificuldades resultantes da pandemia. Para ele, a proposta é “inconsequente e imprestável”.
Para ele, a intenção do governo com a medida é forçar uma fonte de renda que garanta recursos para a expansão de programa de transferência de renda. Porém, para Marciel, a proposta atual traz grandes perdas de arrecadação que irá repercutir tanto à nível federal, como estadual e municipal.
“Todas as estimativas que são apresentadas mostram que haveria uma queda de arrecadação. Dados produzidos pela Secretaria da Receita Federal mostram que haveria no ano de 2022 uma perda de arrecadação de R$ 47 bilhões de reais. Dos quais, R$ 23 bilhões para a União, R$ 11,2 bilhões para os estados e R$ 12,8 bilhões para os municípios. Então é algo completamente incompreensível”, salientou o ex-secretário.
Para o diretor do Centro de Cidadania Fiscal, Bernard Appy, a reforma do imposto de renda é necessária e traz alguns aspectos positivos, como a correção da tabela do IRPF e as tributações nas aplicações financeiras. No entanto, ele considera que existem pontos problemáticos que precisam ser revistos. Entre eles, Appy citou o dispositivo que gera efeito maior no consumo e na folha de salário, em detrimento de se tributar renda e patrimônio, mantendo distorções encontradas no sistema tributário atual.
“O que o projeto faz é reduzir a tributação da renda em cerca, segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), de R$ 37,5 bilhões em 2023 e aumenta a tributação do consumo em cerca de R$ 15 bilhões, sobretudo com a eliminação de benefícios de PIS/Cofins para medicamentos e produtos hospitalares. O projeto tem um problema estrutural. Ele vai na contramão da mudança necessária na composição da tributação no Brasil que seria: aumentar a tributação da renda e reduzir a tributação no consumo”, explicou Bernard.
A mesma observação foi reforçada pelo ex-secretário adjunto de Política Econômica, Sergio Gobetti. Para ele, é preciso rever pontos do texto como as isenções concedidas e criar uma alíquota mais alta do IRPF acima dos atuais 27,5% para buscar uma correção de distorções presentes no modelo de tributação atual.
“Essas mudanças exigem provavelmente mais tempo de discussão, mas eu diria que é melhor a gente prorrogar esse debate do que aprovar de forma açodada igual ou ainda pior do que aquele que veio da Câmara dos Deputados”, alertou Gobetti.
Com informações da Agência Senado