terça-feira, outubro 7, 2025
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Senado iniciará revisão do Código Civil

Foto: DFN

Temas como família, patrimônio, pets inteligência artificial e direito digital estão na pauta de avaliação

O Senado Federal instalou na semana passada a Comissão Temporária para Atualização do Código Civil, que terá a responsabilidade de analisar o Projeto de Lei 4/2025. A iniciativa, apresentada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD–MG), é considerada a maior revisão do Código Civil desde sua entrada em vigor em 2002. O texto foi elaborado com base nas sugestões de uma comissão de juristas coordenada pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Durante a instalação, Pacheco foi eleito presidente do colegiado, que terá como vice o senador Efraim Filho (União–PB) e como relator Veneziano Vital do Rêgo (MDB–PB).

O Código Civil é conhecido como a “Constituição do cidadão comum”, por regular aspectos fundamentais da vida: nascimento, família, contratos, sucessões, propriedade e atividades empresariais. Ao longo de mais de duas décadas, mudanças sociais e tecnológicas evidenciaram a necessidade de ajustes. O novo projeto busca justamente aproximar a lei da realidade contemporânea, incorporando decisões já pacificadas pelos tribunais e criando um capítulo inédito sobre direito digital.

Entre as inovações na área familiar, a proposta amplia o conceito de família, substituindo termos considerados ultrapassados, como “entidade familiar” por “família” e “poder familiar” por “autoridade parental”. Reconhece vínculos conjugais e parentais, legitima a união homoafetiva, já consolidada pelo Supremo Tribunal Federal em 2011, e admite a socioafetividade e a multiparentalidade como fundamentos de relações jurídicas. Também prevê o registro de paternidade pela declaração materna em caso de recusa do exame de DNA, introduz os chamados “alimentos gravídicos”, pensão deverá ser paga desde o início da estação até o final e possibilita o divórcio unilateral em cartório, sem necessidade de ação judicial.

Na esfera patrimonial e sucessória, a proposta estabelece novas regras para herança, retirando cônjuges da linha sucessória quando houver descendentes ou ascendentes diretos, além de permitir a alteração de regime de bens do casamento em cartório. Também prevê a anulação de doações a amantes feita por pessoas casadas ou em união estável até dois anos após o fim da relação. No campo da moradia e propriedade, o texto flexibiliza o usucapião, com possibilidade de reconhecimento em cartório, mas limita o uso desse instrumento para evitar fraudes em áreas rurais e urbanas. Além disso, o texto reforça a proteção da moradia, proibindo a penhora de imóveis únicos da família e criando exceções específicas para residências de alto padrão.

A proteção à dignidade da vida humana também aparece com destaque, reconhecendo a vida pré-uterina como expressão da dignidade humana e estabelecendo limites para a reprodução assistida. O texto proíbe a “barriga de aluguel”, mas permite a barriga solidária em casos médicos, veda a comercialização de óvulos e espermatozoides e o uso de técnicas para criar embriões geneticamente modificados. No tema saúde, assegura ao indivíduo o direito de indicar previamente quais tratamentos deseja ou não receber, caso fique incapacitado no futuro, e amplia regras para a doação de órgãos, dispensando autorização da família quando houver manifestação expressa do falecido.

O projeto também introduz avanços significativos no campo ambiental e dos direitos dos animais, ao reconhecê-los como seres sencientes, capazes de sentir emoções. Com isso, abre espaço para reparação por maus-tratos, indenizações em caso de dano moral relacionado a animais de estimação e até a divisão de despesas com pets entre ex-cônjuges. 

No eixo econômico e digital, a proposta reforça a liberdade contratual, limita juros por inadimplência a 2% ao mês e reduz de dez para cinco anos o prazo de prescrição de direitos. Também exige sede no Brasil para atuação de empresas estrangeiras e regulamenta o patrimônio digital — que passa a incluir senhas, criptomoedas, perfis em redes sociais e milhas aéreas, podendo ser transmitido por herança. Já no campo da tecnologia, reconhece a identidade digital como meio oficial de identificação, estabelece regras para uso de inteligência artificial e responsabiliza plataformas digitais por vazamento de dados e conteúdos lesivos à dignidade, como pornografia falsa e exposição de crianças e adolescentes.

Com um conjunto extenso de mudanças, a revisão do Código Civil busca equilibrar tradição e modernidade. A comissão instalada no Senado terá a tarefa de conduzir os debates de forma a contemplar os avanços sociais e tecnológicos das últimas décadas, sem perder de vista a proteção de direitos fundamentais. A expectativa é que a análise do texto seja uma das mais abrangentes e decisivas do atual ciclo legislativo, impactando diretamente a vida de todos os brasileiros.